O único propósito deste blog continua sendo o mesmo desde seu início; o de divulgar poesia. No começo eu entendia que era interessante publicar a esmo poetas e poemas, sem me preocupar muito em estabelecer certas divisões. Talvez eu estivesse errado. Portanto, mudei o perfil do blog. Agora estamos com um menu de poetas e dentro de cada um seus poemas conhecidos ou não. Não sei se a mudança será boa. Espero que sim!

José Régio



          DEMASIADO HUMANO 


                                       ao Adolfo Casais Monteiro



Escancarei, por minhas mãos raivosas,
As chagas que em meu peito floresciam.
Versos a escorrer sangue eis escorriam
Dessas chagas abertas como rosas...

Assim vos disse angústias pavorosas
Em versos que gritavam... ou sorriam.
Disse-as com tal ardor, que todos criam
Esse rol de misérias fabulosas!

Chegou a hora de cansar..., cansei!
Sabei que as chagas todas que aureolei
São rosas de papel como as das feiras.

Que eu vivo a expor minh'alma nas estradas,
Com chagas inventadas retocadas...
Para esconder bem fundo as verdadeiras.

(José Régio, in Antologia. Seleção e Organização: Cleonice Berardinelli. Editora Nova Fronteira, 1985)




O MANEQUIM

Quando Hamlet, Gran Senhor predestinado,
Ressussitou em mim sua Loucura,
Quis eu, para o trazer de braço dado,
Modernizar-lhe o espírito e a figura:

Pondo-lhe um riso frígido e afiado
Nos lábios retorcidos de amargura,
Modelei-o num fraque bem talhado
Que lhe vincasse os gestos e a estatura.

Depois lhe abri o enigma da Ironia
Para que a sua atroz melancolia 
Calçasse luvas... e ostentasse o ar fino.

Hoje, ó meu Grande! ó Príncipe de todos!
Já te posso exibir: Tens belos modos, 
E sofres... mas consoante o figurino.

(José Régio, in Antologia. Seleção e Organização: Cleonice Berardinelli. Editora Nova Fronteira, 1985)