O único propósito deste blog continua sendo o mesmo desde seu início; o de divulgar poesia. No começo eu entendia que era interessante publicar a esmo poetas e poemas, sem me preocupar muito em estabelecer certas divisões. Talvez eu estivesse errado. Portanto, mudei o perfil do blog. Agora estamos com um menu de poetas e dentro de cada um seus poemas conhecidos ou não. Não sei se a mudança será boa. Espero que sim!

Ricardo Reis (Heterônimo de F. Pessoa)



[PARA SER GRANDE]

Para ser grande, sê inteiro: nada

        Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és 
        No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a luta tôda
         Brilha, porque alta vive.

                                     14-2-1933


(ODES DE RICARDO REIS. Heterônimo de Fernando Pessoa. Seleção Poética. Companhia José Aguilar Editora - MEC. 1971)




[QUERO DOS DEUSES...]


Quero dos DEUSES só que me não lembrem.

Serei livre - sem dita nem desdita,
Como o vento que é a vida
Do ar que não é nada.
O ódio e o amor iguais nos buscam; ambos,
Cada um com seu modo, nos oprimem.
          A quem deuses concedem
          Nada, tem liberdade.

(Odes de Ricardo Reis, Heterônimo de Fernando Pessoa. FERNANDO PESSOA, seleção poética. Biblioteca Manacial, 1971.)




[COROAI-ME DE ROSAS]

Coroai-me de rosas,
Coroai-me em verdade
De rosas -
Rosas que se apagam
Em fronte a apagar-se
Tão cedo!
Coroai-me de rosas
E de fôlhas breves.
E basta.

(Odes de Ricardo Reis, Heterônimo de Fernando Pessoa. FERNANDO PESSOA, seleção poética. Biblioteca Manacial, 1971.)



Mestre, são plácidas
Todas as horas
Que nós perdemos.
Se no perdê-las,
Qual numa jarra,
Nós pomos flores.

Não há tristezas
Nem alegrias
Na nossa vida.
Assim saibamos,
Sábios incautos,
Não a viver,

Mas decorrê-la,
Tranquilos, plácidos,
Tendo crianças 
Por nossas mestra,
E os olhos cheios
De natureza...

À beira-rio,
À beira-estrada,
Conforme calha,
Sempre no mesmo
Leve descanso
De estar vivendo.

O tempo passa,
Não nos diz nada.
Envelhecemos.
Saibamos, quase
Maliciosos,
Sentir-nos ir.

Não vale a pena
Fazer um gesto.
Não se resiste
Ao deus atroz
Que os próprios filhos
Devora sempre.

Colhamos flores.
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos
Calma também.

Girassóis sempre
Fitando o Sol,
Da vida iremos
Tranquilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido.

(ODES DE RICARDO REIS. Fernando Pessoa. Obra Poética III. L&PM Pocket, vol. 516. 2011.)